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sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Romeu e Julieta - Cena V



Uma sacada que dá para os aposentos de Julieta, sobre o jardim.


JULIETA — Já vai embora? Mas se não está nem perto de amanhecer! Foi o rouxinol, não a cotovia, que penetrou o canal receoso de teu ouvido. Toda a noite ele canta lá na romãzeira. Acredita-me, amor, foi o rouxinol.


ROMEU — Foi a cotovia, arauto da manhã, e não o rouxinol. Olha, amor, as riscas invejosas que tecem um rendado nas nuvens que vão partindo lá para os lados do nascente. As velas noturnas consumiram-se, e o dia, bem-disposto, põe-se nas pontas dos pés sobre os cimos nevoentos dos morros. Devo partir e viver, ou fico para morrer.


JULIETA — Essa luz não é a luz do dia, eu sei que não é, eu sei. É só algum meteoro que se desprendeu do sol, enviado para esta noite portador de tocha a teu dispor, e iluminar-te em teu caminho para Mântua. Portanto, fica ainda, não... precisas partir.


ROMEU — Que me prendam! Que me matem! Se assim o queres, estou de acordo. Digo que aquele acinzentado não é o raiar do dia; antes, é o pálido reflexo da lua. Digo que não é a cotovia que lança notas melodiosas para a abóbada do céu, tão acima de nossas cabeças. Tenho mais ânsia de ficar que vontade de partir. — Vem, morte, e seja bem-vinda! Julieta assim o quer. — Está bem assim, meu coração? Vamos conversar... posto que ainda não é dia!


JULIETA — É dia sim, é dia sim. Corre daqui, vai-te embora de uma vez! É a cotovia que canta assim tão desafinada, forçando irritantes dissonâncias e agudos desagradáveis. Alguns dizem que a cotovia separa as frases melódicas com doçura; não posso acreditar, pois que ela vem agora nos separar. Alguns dizem que a cotovia é o odiável sapo permutam seus olhos; como eu gostaria, agora, que eles também tivessem permutado suas vozes! Essa voz alarma-nos, afastando-nos um dos braços do outro, já que vem te caçar aqui, com o grito que dá início à caçada deste dia. Ah, vai-te agora; ilumina-se mais e mais a manhã.


ROMEU — Ilumina-se mais e mais... enquanto anoitece em nossos corações!


[Entra a Ama.]


AMA — Madame!


JULIETA — Ama?


AMA — A senhora tua mãe vem vindo para os teus aposentos. Amanheceu. Sê prudente, cuida do que acontece à tua volta.


[Sai.]


JULIETA — Então, janela, deixe entrar o dia e deixe fugir a vida.


ROMEU — Adeus, adeus! Um beijo, e eu desço.


[Desce.]


JULIETA — Estás indo embora assim? Meu esposo, meu amor, meu amigo! Preciso ter notícias tuas todo dia, a cada hora, pois num único minuto cabem muitos dias. Ah, por essa contagem estarei velhinha antes de reencontrar o meu Romeu.


ROMEU — Adeus! Não perderei oportunidade em que possa transmitir a ti, amor, meus sentimentos.


JULIETA — Acreditas que nos veremos de novo?


ROMEU — Não duvido nem por um momento. E todas essas aflições servirão de tema para doces conversas em nosso futuro.


JULIETA — Ah, Deus! Como minha alma é agourenta. Penso ver-te, agora que estás aí embaixo, como alguém morto, no fundo de uma tumba. Ou meus olhos estão me enganando ou estás muito pálido.


ROMEU — Acredita-me, amor, enxergo-te igualmente pálida. A tristeza, insensível, nos bebe todo o sangue. Adeus, adeus!

[Sai, abaixo da sacada]


~ William Shakespeare ~